O frio traz seus encantos. Traz também mãos e pés gelados, e uma vontade inesgotável de hibernar. Dirceus, Genoínos, Valerios e agregados, numa sucessão de novos fatos que apenas repetem os velhos e conhecidos acontecimentos, aumentam o frio da estação – adicionam mais um banho gelado direto na cabeça, já meio entorpecida pela temperatura.
Ipês na Avenida da Saudade |
Quem sabe ao acordar na primavera a vida já terá melhorado.....
A cama é boa, mas a mente alerta: é preciso se mover, não ficar parado, a vida pede ação. O corpo reage contra, mas o velho hábito da luta vence o desejo do abandono ao ócio (como diz Domenico de Masi, o ócio pode ser criativo – acho que no mínimo cria o prazer de não fazer nada).
A caminhada pela avenida do cemitério Cabreúva aquece pés e mãos e clareia um pouco os pensamentos. Bom lugar para reflexões. Quem dera fosse assim o caminho do fim da vida: calmo e florido.
Quem sabe, na hora derradeira, quando a alma estiver se libertando do corpo, as borboletas amarelas do Gabriel Garcia Márquez cubram de poesia e colorido esse momento definitivo. Pensamentos funestos, mas a beleza e a quietude do lugar a eles induzem.
Ipê na Avenida da Saudade |
Os ipês de SBO – amarelos vibrantes, brancos e rosas delicados, roxos magnificos contrastando com o iluminado céu azul – são um bom motivo para sair do aconchego e respirar o ar da cidade. Sem hora, sem compromisso, sem despesa.
Ipê na Avenida Tiradentes |
Parece pouco, mas disso também é feita a vida, não apenas das coisas contáveis e mensuráveis.
Claro, as contáveis e mensuráveis também nos fazem felizes, e não são poucas. O número de filhos que temos – uma, duas, três.. ou mais boas razôes para vivermos. O número de anos em que vivemos com a pessoa amada. O número de dias em que amamos o nosso trabalho. As milhares de horas em que nos sentimos amados. A quantidade de minutos de duração do filme eletrizante que nos prendeu a uma outra realidade. O número de páginas do livro instigante que nos mostrou uma outra (realidade) ou nos abriu os olhos para a nossa própria. O número de ipês de Sbo, que ano após ano, inverno após inverno, saciam os nossos olhos com a beleza espontânea que tanto procuramos.
Ipê na Avenida Santa Bárbara |
ooooooooo
A esta altura, o inverno quase (ou já) passou, mas ainda uma ou outra cobertura arroxeada pode ser vista por aí. O que não acabou (e ainda perdura até a entrada da primavera) é a sucessão chocante de denúncias que maltratam o coração do cidadão brasileiro.
Pois é, se eu tivesse hibernado e acordado somente na primavera, ao acordar certamente veria muito sol, muita luz, muito calor e o clima político do inverno infinitamente mais aquecido... As estações vão e voltam, mas no fim nada muda, tudo permanece o mesmo...
Ipê na Estação Cultural (antiga Fepasa) |
Texto: Bete Padoveze
Sete anos se passaram desde que escrevi esta crônica e somente agora os responsáveis pelo Mensalão estão sendo julgados...
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