sábado, abril 08, 2006

À janela

 
























Caminhava apressadamente...

...imersa em planejamentos e situações virtuais, quando meu olhar mecanicamente detectou um movimento, uma sombra na janela aberta da casa antiga, rente à calçada. Também mecanicamente parei (a curiosidade é própria das mulheres e, em mim, meu melhor defeito).

Tudo quieto, apenas o dançar das cortinas se via. Com sentimentos de culpa pela intromissão na vida alheia, desviei o olhar, já a postos para retomar meu caminho. Foi o que fiz.

Subitamente, senti a mesma sensação de sombra, de movimento, talvez um certo calor. Diminui o passo e num espaço de segundos ponderei todas as razões – pró e contra – para voltar e olhar novamente. Ah, maldita curiosidade que me leva a atitudes impensadas. Soubesse eu aonde me levaria e jamais teria olhado, prestado atenção novamente...

Pela segunda vez nada vi. Mas louca não estava! É bem verdade que às vezes a esquisitice me acomete, os pensamentos se tornam criativos por demais e, mais que qualquer novelista da Vênus Platinada, crio enredos verdadeiramente mirabolantes. Porém, sem cacife e sem coragem, não concretizo minhas invenções. Pois bem, como disse, louca não estava e certamente havia algo naquela janela aberta rente à calçada que me interessava.

Fingi continuar, mas encostei-me às paredes e esgueirei-me por debaixo do peitoril para alcançar o outro lado, na tentativa de enganar quem quer que lá estivesse, a mangar de mim, inocente transeunte. Já criava (de volta a novelista) diálogos duros e moralistas para encher de vergonha o desocupado que estivera a me tocaiar. Fiz expressão séria de professorinha, que me custava manter. Pareceu-me uma eternidade o tempo que lá esperei – alguns segundos, e tornei-me tão impaciente quanto fico enquanto aguardo o meu pobre 486 responder aos comandos.

Um leve e cuidadoso ruído e então apareceu... Ele.

A casa era antiga e ele não era muito menos, mas os olhos miúdos e negros eram extremamente jovens, audaciosos e brilhantes.

Chamou-me. Fez perguntas. Como se tivesse me conhecido por toda a vida. Conseguiu um número de telefone. Aos poucos – a bem da verdade, muito rapidamente – entrou na minha vida.

E mais não conto, pois não posso. E se sentirem vontade de saber tudo o mais, volto a dizer: a curiosidade é terrível defeito! Em mim, o meu melhor....

Foto: Bete Padoveze (Casa do Povoador – Rio Piracicaba)
07/02/01

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